IMG 20220827 WA0032

Mais de R$ 4 milhões arrecadados pelo empresário e coach Pablo Marçal para a construção de casas para o povoado de Camizungo, em Angola, foram destinados a duas ONGs em Prata, cidade de 4 mil habitantes no interior da Paraíba. O Intercept Brasil visitou o município para conhecer de perto as organizações beneficiadas pela campanha de doações capitaneada pelo candidato do PRTB à prefeitura de São Paulo nos últimos cinco anos.

Na cidade de pouco mais de 4 mil habitantes estão sediados os CNPJs das ONGs Atos, responsável pelas ações sociais na África, e Centro Vida Nordeste, que atua no semiárido. Mas descobrimos que a sede da Atos sequer existia até o Intercept revelar as falsas promessas de Marçal em Camizungo. Tem mais: a Centro Vida Nordeste está cadastrada em nome do dono de uma casa de apostas ilegais na cidade.

Em Prata, ninguém conhece pessoalmente Pablo Marçal. A cidade foi envolvida na trama de Angola por causa de Itamar Vieira, amigo do ex-coach e líder da ONG Atos em Angola, responsável pelo projeto de Camizungo.

Vieira, hoje pastor da Igreja Diante do Trono em Angola – fundada por Ana Paula Valadão, da família criadora da Igreja Lagoinha –, convidou seu amigo Pablo Marçal a apoiar a iniciativa missionária no país africano em 2019. Desde então, o ex-coach fez várias campanhas de doações para “erguer uma cidade” em Camizungo – e elas vão para os CNPJs das duas ONGs paraibanas. Mas o uso de nomes de um casal de moradores de Prata como representantes legais das ONGs envolvidas no projeto em Angola tem causado caos no pequeno município.

“Estou há uma semana sem dormir”, me disse José Leandro Ferreira. No papel, ele é o presidente do Centro Vida Nordeste. Mas, nas ruas da cidade, ele é conhecido como Zé da Banca, por ser dono da Confiança Sports, estabelecimento que oferece diversas modalidades de apostas, incluindo o jogo do bicho.

“Todo mundo leu tua matéria. E ninguém consegue acreditar que tem um valor tão grande passando aqui pela cidade, enquanto a gente passa tantas dificuldades por aqui”, me disse uma moradora. Por lá, de fato, mais de 50% da população depende do Bolsa Família, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
“Essas pessoas que vocês disseram que são as donas desses CNPJs aí nem trabalham com isso. A gente conhece todo mundo”, afirmou outro pratense. Zé da Banca confirmou o incômodo com o clima na cidade: “Nossa vida virou um pesadelo. Ninguém para de falar disso com a gente”.

E, de fato, ele não é o único nessa situação. Quando chegamos em Prata, fomos buscar o endereço da ONG Atos cadastrado nos dados da Receita Federal. Conversamos com diversos moradores. Mas ninguém parecia conhecer ou sequer ter ouvido falar da Atos. Bater em algumas portas confirmou a suspeita: a ONG era totalmente desconhecida em sua própria cidade.

Em meio às conversas nas ruas do município, encontramos Rosana Tavares da Silva Menezes, que, de acordo com os dados fornecidos à Receita Federal, seria diretora da ONG Centro Vida Nordeste. Em pleno horário de expediente, ela caminhava pela rua empurrando um carrinho de criança.

Fonte: The Intercept Brasil