O ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) tem sido tema de discussões após a alteração que elevou a alíquota para 8% com a progressividade no cálculo do tributo. Segundo Roger Mitchel, diretor da Contabilidade Internacional, a atualização chamou a atenção para as pautas relacionadas à herança, levantando questões de jurisprudência e sobre como é possível proceder para evitar a realização de inventário.

Ele explica que a herança é um termo jurídico que se refere ao conjunto de bens, direitos e obrigações transmitidos aos herdeiros após o falecimento de um cidadão. Esta transferência patrimonial pode incluir elementos tangíveis como dinheiro, ações, joias, obras de arte e propriedades, assim como imóveis, sejam eles residenciais, comerciais ou rurais.

“A Constituição assegura o direito à herança e o Código Civil estabelece as normativas para a sucessão dos bens”, detalha Mitchel. “Existem, primordialmente, duas formas de sucessão reconhecidas no país: a sucessão legítima e a sucessão testamentária”, complementa.

O especialista destaca que, em termos simples, a transmissão de qualquer patrimônio, seja por herança ou doação, passou a ser mais onerosa, afetando diretamente a capacidade das famílias de preservar seus bens ao longo das gerações. “Agora, juntamente com o inventário, a transmissão de riqueza geracional ficou mais cara”, considera.

Na visão de Mitchel, a intenção por trás da medida visa tornar a distribuição de riqueza mais equitativa, embora já existam impostos empresariais que fazem isso, como o PIS (Programa de Integração Social), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) e as contribuições do Sistema S, que arrecadam mais que o imposto sobre a herança. 

“As consequências dessa cobrança adicional vão além da mera intenção, já que o Brasil possui uma teia intrincada de impostos municipais, estaduais e federais, e uma pequena alteração nessa cadeia complexa gera consequências a médio e a longo prazo”, articula.

Para Mitchel, o aumento do ITCMD coloca uma pressão adicional sobre os brasileiros com negócios familiares que, agora, enfrentam um desafio para garantir a continuidade de suas empresas após a morte de ambos, patriarca e matriarca, porque inventário e imposto sobre a herança incidem sobre ambos os falecimentos.

“O contexto tributário, jurídico e econômico brasileiro, já complexo por natureza, vê-se agora ainda mais intrincado com essa nova configuração tributária”, afirma. “As famílias precisam lidar com a burocracia do processo de inventário e com a carga tributária que pode comprometer o legado deixado para as próximas gerações. A questão que se impõe é: estamos preparados para essa nova realidade?”, questiona.

Progressividade desafia as famílias brasileiras

O diretor da Contabilidade Internacional destaca que a progressividade do ITCMD implica que quanto maior o valor da herança, maior será a alíquota de imposto aplicada – uma mudança que tem um impacto significativo na forma como as famílias brasileiras planejam a transmissão de patrimônio.

Para Mitchel, se o ITCMD fosse o único tributo a ser cobrado no falecimento de pai e, novamente, no falecimento de mãe, sua cobrança seria justa. Mas quando  também há o inventário judicial, e a dificuldade de se conseguir realizar um inventário no cartório e sem honorários advocatícios, a cobrança é dupla.

“Há um desdobramento de tributos que precisam ser recolhidos no falecimento: impostos municipais, impostos estaduais e impostos federais, além do inventário”, ressalta. Ou seja, o ITCMD não é a única cobrança: “Esse modelo de tributação não é único no mundo, mas sua aplicação no Brasil traz desafios particulares devido às especificidades da economia e da sociedade brasileira”, diz Mitchel.

Para o especialista, a progressividade pode incentivar práticas de planejamento sucessório complexas e onerosas, na tentativa de minimizar a carga tributária. Isso, por sua vez, pode criar uma indústria de consultoria voltada para a elisão fiscal, acessível apenas às famílias mais abastadas, aumentando ainda mais a desigualdade que a medida buscava combater.

“Com as novas regras, o planejamento sucessório torna-se uma ferramenta essencial para as famílias brasileiras”, afirma. Para ele, a necessidade de se antecipar aos impactos fiscais da transmissão de patrimônio exige um conhecimento aprofundado das leis e uma estratégia bem definida – o que pode incluir a reestruturação de bens, a criação de testamentos específicos e, até mesmo, a antecipação de doações como forma de distribuir o patrimônio de maneira mais eficiente.

“Muitas famílias podem não estar preparadas para a complexidade adicional. A falta de informação e a dificuldade de acesso a profissionais qualificados em planejamento sucessório podem levar a erros custosos, aumentando a carga tributária e comprometendo a transmissão de bens para as próximas gerações”, diz Mitchel. “Além disso, o custo de implementação pode ser proibitivo para famílias de menor renda, exacerbando as desigualdades já existentes”, acrescenta.

O diretor da Contabilidade Internacional ressalta que, embora teoricamente justa, a progressividade do ITCMD pode penalizar as famílias que estão na borda da ascensão social, para quem a transferência de patrimônio representa a chance de “mudar de vida”. 

“Devem ser desenvolvidas políticas complementares para amortecer o impacto, como incentivos para a educação financeira, apoio ao empreendedorismo e medidas que facilitem o acesso ao crédito para famílias de baixa e média renda”, afirma. “A chave para um Brasil mais justo e equitativo não está apenas em tributar mais, mas em criar condições para que todos possam prosperar”, finaliza.

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